terça-feira, 16 de maio de 2017

Ser "Comando" é arriscado


O Ministério Público que investiga a morte de dois instruendos ocorrida durante o Curso 127 de "Comandos" anda a divagar numa série de erros e pressente-se a sua orientação em tentar castigar aquela instituição militar como um "bando de homicidas". Em primeiro lugar, o MP começa logo por considerar o Exército como uma democracia onde se encontram presentes todos os direitos humanos. Não é. Mal da tropa se fosse um lugar onde as decisões se tomam por votação. Havia de ser bonito se em caso de acção uns votassem pelo combate e outros pela fuga.
Se em situações normais prevalece a hierarquia, num curso de "Comandos" os instruendos são sujeitos a "abusos de poder" e estão, como eu e muitos milhares de outros estiveram, na bizarra situação de "abaixo de cão". Quantas vezes na parada tinhamos de saudar militarmente os cães porque eles eram nossos superiores. Faz parte da componente psicológica do curso. Andei dezenas e dezenas de quilómetros com os instrutores a berrarem-me aos ouvidos "vais morrer, vais morrer" ou "a tua mãe é uma cabra" ou "a tua mulher (ou namorada) estão a esta hora a foder com outros". E então? Fechava os ouvidos e concentrava-me na caminhada e no esforço sobre-humano que tinha pela frente. 
Se um candidato a "comando" não aguenta um sopapo nas trombas ou um pontapé no cu não pode aspirar a concluir esta especialidade. Os "comandos" são tropas de assalto para resolver casos desesperados. Como se preparam estes homens se não com um treino duro, o mais próximo possível da realidade, independentemente do frio ou do calor, da neve ou da chuva.
Estes cursos são para voluntários que sabem ao que vão, inclusivamente são militares de outras especialidades e não civis desprevenidos. A morte é possível em qualquer altura destes cursos, desde uma queda do pórtico, do slide, do rappel, da vala, da escada escocesa, do muro, no campo de infiltração, no fogo real, enfim, entre tantos perigos os acidentes mais ou menos graves não são de excluir. A morte acompanha-nos do primeiro ao último minuto, mas não existe, como subentende o MP, homicidas paranóicos entre os instrutores. 
Quantas pessoas vão aos hospitais por se sentirem mal, são observadas e medicadas e morrem ao chegarem a casa. Inúmeras por ano. 
Eu sei o que custa perder um camarada em instrução. Acompanhei um furriel a uma DO para ser evacuado para Lisboa depois de ser atingido por um tiro de heli-canhão em Santa Margarida. Morreu e foi sepultado em Leiria. 
Nós choramos os nossos mortos mas a vida continua. E a instrução também. 

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