quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

O enterro da dignidade


Mário Soares já descansa em paz na sua última morada.  Para tranquilidade dele mas também da família e dos amigos. Seja ou não protocolar a verdade é que o espectáculo acabou por se desenrolar pelas ruas de Lisboa e pelo país através das televisões. E á semelhança do que tinha acontecido com Sá Carneiro existiu um miserável aproveitamento político-partidário. 
Salvo os depoimentos sinceros de quem privou na realidade e ao longo de anos com Mário Soares, dispensavam-se os testemunhos cínicos, oportunistas, falsos de sentimentos, choramingas de carpideiras sem vergonha, palavras de estatuto de ocasião, latidos de caninos a que só não abanaram a cauda porque não a possuem mas dobraram mais a espinha que os contorcionistas do circo. 
Degradante ouvir quantos vociferaram, insultaram, amaldiçoaram e conspiraram contra um dos fundadores do Partido Socialista que apareceram de lágrima no olho, voz embargada, palavras rebuscadas em busca de um mísero minuto ou dois de presença na História de Portugal. Estes abutres oportunistas pavonearam-se nas televisões, rádios e jornais numa competição asquerosa pela frase mais pungente, o cognome mais espampanante ou o episódio mais comum inchado até á gordura do absurdo. 
Houve jornais que inclusivamente fecharam as caixas de comentários aos leitores para se evitarem as alarvidades habituais que não passam de fundamentalismos da "liberdade de expressão" que tantos apregoam e tão poucos praticam. Mário Soares, que não se eximiu da chamar "cabrão" ao general Ramalho Eanes, tão pouco se importaria com os pornográficos   adjectivos impressos nessas secções. Mas há que seja mais papista que o chefe do Vaticano e não hesitou em fechar o jornalismo na gaveta para se tornar publicitário e arrancar das entranhas de cérebros obtusos os slogans banais de "pai da pátria", "pai da democracia", "pai da liberdade", enfim progenitor de um rancho de filhos á antiga portuguesa ou á medida de Estaline, o "pai dos povos" da extinta União Soviética.
Cheguei a duvidar, baralhado por este turbilhão de histerias descontroladas, da existencia de D. Afonso Henriques e se não estaria ainda enredado nas truculencias do Condado Portucalense. Parece que nos safámos por pouco...

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