domingo, 20 de novembro de 2016

O "ódio" da Procuradora aos "Comandos"


A Procuradora Cândida Vilar é a coordenadora da investigação, com a colaboração da Polícia Judiciária Militar, das mortes dos instruendos  Hugo Abreu e Dylan Silva durante o 127º curso de "Comandos". A decisão é da responsabilidade de Lucília Gago, directora do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa, e de Maria José Morgado,  que chefia a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa.
A escolha, segundo Maria José Morado,  baseou-se  na "inestimável experiência" e "provas dadas de firmeza, combatividade e capacidade de exercício da acção penal relativamente ao fenómeno da criminalidade especialmente violenta, altamente organizada ou de natureza grupal com características itinerantes ou transnacionais" da procuradora.
Posso retirar da opinião acima citada que Cãndida Vilar foi encarregada do caso por se suspeitar que um  grupo de militares especialmente violentos e organizados terão contribuído para um crime especialmente brutal. 
No currículo da Procuradora, alcunhada de Superprocuradora nos meios em que se move, consta a detenção do maior grupo de skinheads de sempre, liderado por Mário Machado (ainda preso), e vários processos mediáticos como o do Gangue do Multibanco, o dos No Name Boys e a Máfia da Noite. 
Desta feita, quiçá para evitar mais "barracas" como as fugas prolongadas do "Palito", do "Piloto" e dos árabes que se escapuliram do aeroporto de Lisboa, o Ministério Público, receoso talvez que os "Comandos" se entrincheirassem nalguma serrania e nunca mais os encontrassem, foi prender, com o devido aparato, sete "Comandos", médico responsável pelo acompanhamento dos recrutas e o director do curso e cinco instrutores. Os detidos, já como arguidos, segundo a PGR, são suspeitos de crime de abuso de autoridade e ofensa à integridade física.
A procuradora Cândida Vilar deduz que os sete militares detidos eram “movidos por um ódio patológico, irracional contra os instruendos, que consideram inferiores por ainda não fazerem parte do Grupo de Comandos, cuja supremacia apregoam, à gravidade e natureza dos ilícitos”. Ponto final. Isto, concluiu ela, ainda antes de o juiz de instrução ouvir os detidos. 
Fico agora a perceber, passando esta crónica ao plano da minha experiencia pessoal, que os meus instrutores do Curso de Operações Especiais (Rangers) efectuado em Lamego, no início dos anos 70 me "odiavam patologicamente" quando me mandaram marchar 90 km em 24 horas por serras e vales da Beira Alta, carregado com armas, munições e mochila, sem água, sem comida, com Técnica de Combate, campos de infiltração, rappel, fogo com metralhadoras pesadas, granadas e morteiros pelo meio, isto logo a seguir a uma semana de Dureza 11 no mato, sem dormir, água muito racionada e um pão e uma conserva de ração diária para sobreviver a todo este esforço. 
Era também "ódio patológico" contra a minha pessoa quando esses instrutores passaram semanas a insultarem-me e a minha família e a berram-me aos ouvidos que iria "morrer ali".  Por acaso ia morrendo mesmo quando o "tunel do amor", na serra das Meadas, desabou quando ia a rastejar de costas dentro dele e foi um dos cães, o Jack, que sempre nos acompanhavam, quem deu o alarme  e lá me retiraram a custo, meio sufocado, com o nariz e a boca cheios de terra. Vá lá, pelo menos o cão não me "odiava patologicamente"...
Acho que a Procuradora confunde "ódio patológico" com a encenação psicológica que é necessária e fundamental num curso de tropas especiais. E verdade que existem sempre instruendos que são mais causticados que outros mas isso decorre da forma como cada um reage ao esforço físico ou psicológico e quando erram são sujeitos a um TE (Tratamento Especial). Mas todos passámos por isso em Lamego. 
Se é verdade que um quartel não pode ser um "matadouro" também é verdade que não é um local de culto democrático. Ali impera o Regulamento de Disciplina Militar. 
Se estes cursos são demasiado duros para a sociedade de hoje é algo que, sem dúvida, deve ser discutido. Especialmente numas Forças Armadas com muito material obsoleto, desde espingardas a aviões, passando por navios. Não vale a pena esconder ou sobrevalorizar ou manifestar surpresa pela existencia de vítimas nos treinos militares. Houve dezenas de mortos no passado e haverá mais algumas no futuro. Eu fui testemunha de casos mortais.
È desonesto é que autoridades militarem, civis ou judiciais finjam que nunca se passou nada.



1 comentário:

  1. Concordo plenamente com este texto, e assino por baixo. Também estive em Angola em 1965/67. E agora me lembro que também eu, e os meus Camaradas da minha Companhia, fomos vítimas do "Ódio Patológico" porque andamos no mato durante três dias e três noites, sem encontrar uma pinga de água para matar a sede... com temperaturas de quase 40 graus...! E nem sequer tive preparação para isso, porque era condutor. Eu também fui uma vítima do "Ódio Patológico"...!

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