quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Mortes nos Comandos e na Força Aérea

O Verão foi adverso para as Forças Armadas. Cinco mortos em treinos. Tres vítimas na Força Aérea, em Julho, e dois instruendos dos Comandos, em Setembro.Trágico. 
No entanto, os casos tem sido tratados de modo absolutamente diferente. Enquanto a explosão do C-130 foi encarado como uma "normalidade", excepto para as famílias, com um inquérito a concluir que o acidente se deveu a "erro humano", nos Comandos a opinião pública e publicada gerou uma onda a fazer crer que se tratou de um "crime" e a justiça já constituiu dois enfermeiros como arguidos.
Cabe-me aqui esclarecer um ponto que considero importante. Se há duas especialidades militares em que só são admitidos candidatos com uma saúde de ferro é precisamente a de piloto-aviador, para poder suportar as tremendas forças G das manobras das aeronaves e nos Comandos, onde é necessário ultrapassar uma preparação física e psicológica acima do normal.
Fiz o curso de Operações Especiais, em Lamego, nos anos 70, e embora a nível técnico as fórmulas difiram nos seus objectivos, no plano físico e psicológico são identicas ás dos Comandos. As sessões de treino são acompanhadas por dois oficiais e dois sargentos que efectuam os exercícios antes dos instruendos  para eles saberem o que vão fazer em seguida. Todos, sem excepção, comem o pão que o diabo amassou. Eu também o comi e poderia contar episódios inacreditáveis da nossa instrução. Aliás, revelei algumas dessas peripécias num livro que publiquei em 2001 com o título "Sombras de Ninguém".
A diferença entre a preparação dos Comandos e Rangers do meu tempo para agora é que actualmente efectuam-se exames médicos e acompanhamento clínico e na minha altura nunca vi um médico ou um enfermeiro por perto e quanto a consultas ou observações  sobre o estado de saúde nada de nada. Em todo o tempo de serviço militar nunca fui sequer auscultado quanto mais examinado. Levavam-se as vacinas e ponto final. Quem morria, morria, e aconteceu tanto na instrução como, mais tarde, numa IAO, em Santa Margarida, com um furriel da minha companhia a ser atingido mortalmente por um tiro "amigo" de héli-canhão. 
Estranho que os enfermeiros (sem a especialidade de Comando) tenham sido constituídos arguidos. Acima deles, na hierarquia dos postos, encontravam-se oficiais e sargentos instrutores e um capitão-médico com a especialidade de Comando. Que se saiba os enfermeiros não abandonaram os seus postos e daí não encontrar justificação para estarem sujeitos aquela medida de coacção. 
Sei por experiencia própria que nestes cursos de tropas especiais a vertente psicológica é fundamental. Quando falha, a capacidade física entra em colapso e o organismo fica vulnerável. Nunca me passou pela cabeça percorrer 90 km em 24 horas, carregado e com provas pelo meio e consegui. Ainda hoje me pergunto como...
No inquérito do acidente da Força Aérea colocou-se o carimbo "erro humano". Uma conclusão fácil que nem precisa de investigações mais profundas como a proveta idade dos aparelhos C-130. O aval á "normaliade" da "anormalidade" foi dado, infeliz e inoportunamente, pelo Presidente da República, que, dias depois, visitou a base do Montijo e voou num outro C-130, embora sem manobras esquisitas. 
Há anos, 25 de Setembro de 1975, encontrava-me colocado no Batalhão de Caçadores 4513 e ouvi uma explosão muito forte na zona da Atalaia. Fora um Nord-Atlas que explodiu ao descolar de Tancos. Morreram 11 oficiais e sargentos. Também um primo meu da Força Aérea foi uma das muitas vítimas da queda de um DC-4 Skymaster, em São Tomé e Príncipe, em Novembro de 1963. Os aviões são óptimos quando não se despenham. E ás vezes o acidente acontece devido a pormenores insignificantes, como foi o caso do avião supersónico de passageiros "Concorde" ao levantar de Paris.
Seguindo o mesmo critério do desastre da Força Aérea, Marcelo Rebelo de Sousa também poderia ter visitado o quartel dos Comandos e manifestar-lhes a sua solidariedade. Os homens da "boina vermelha" não são malfeitores cruéis que se vangloriem com a morte de quem está ao seu cuidado.

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